Por que
olhar por partes, sem antes compreender o todo? Por que enxergar a
deficiência antes mesmo de saber mais sobre aqueles que não andam,
não enxergam ou não ouvem? Por que apontar o que o outro não pode
fazer, antes de perguntar o que ele tem a oferecer?
Reflexão a partir do texto:
O MODELO DOS MODELOS
Ítalo Calvino
A abordagem
das pessoas com deficiência somente no presente tem encontrado uma
perspectiva mais positiva, ainda sim convive com a constante
desconfiança, com o assistencialismo e com a resistência. É um
comportamento em modelagem. Embora sistematicamente menor, é uma
realidade a relutância e a recusa em aceitar a necessidade e direito
de um tratamento igualitário em todas as faces da vida. Na medida de
suas diferenças, as pessoas têm o direito de receber um tratamento
digno, justo e equitativo, bem como os suportes necessários para que
possam exercer a sua cidadania e seus direitos. Dessa forma também é
na educação, que a partir da Constituição de 1988 e com o reforço
da LDBEN/1996, se trata de um direito de todos e que, sempre que
possível, deve ser acessada na rede regular. O aluno com
deficiência, seja ela da natureza que for, deve ser inserido no meio
regular, para que possa se beneficiar e beneficiar os demais com a
diversidade e com as estratégias e ganhos que revestem a sua
presença e abordagem. O Atendimento Educacional Especializado (AEE)
é uma porta para essa equiparação, para o oferecimento de
igualmente. Mas...
Embora
explicitamente a sociedade escolar e geral se declare em uma fase de
abertura, nem sempre a realidade ocorre dessa maneira. Alunos e
professores podem ter resistências à presença educacional da
pessoa com deficiência, seja por não saber como lidar com aquela
necessidade, seja pelas demandas que a presença traz à prática
profissional ou menos por conceitos anteriormente formados que
impedem o contato pleno com a realidade. Implicitamente, na verdade,
há muito da vida de Palomar em sua época de desejo de perfeição,
porque dentro daquela harmonia pretendida, transportando para a
educação, lhe pareceria tão mais fácil aplicar o educacional, os
projetos, os objetivos. Se os alunos não fossem tão diferentes...
Mesmo
assim, como estamos em um processo de migração, de mudança de
conceitos, uma parte significativa, ainda que possa relutar com seus
valores de resistência (e outros não que não possuem essa questão)
se empenham para o aproveitamento das diferenças e de suas
possibilidades. Na variedade humana conseguem compreender o quadro
que pode ser tecido se cada configuração for respeitada e dela for
retirado, em sua pessoalidade o melhor. Esse grupo representa o todo
docente e educacional, bem como social, que investe nas metodologias
diferenciadas orientadas às diversidades que podem ocorrer na
educação, não apenas as que se referem à educação inclusiva e
especial. Contudo, da mesma forma que Palomar, esse grupo que vive
tal fase de transição também corre o risco de desenvolver uma
modelagem da diversidade que sirva “para todos” e o que para
todos serve, em verdade não serve a ninguém. O grande desafio do
momento presente é também igual ao da vida intermediária de
Palomar e, dessa forma, implica no reconhecimento da não existência
de fórmulas e da pessoalidade, para que não se caia no mal da
padronização mesmo do diverso, massificando o que se trabalha para
tornar diferente.
Esse é o
caminho futuro para o qual a educação e também o AEE como suporte
rumam no cenário educacional para obter. Oferecer a possibilidade do
ensino geral, dentro da individualidade, da pessoalidade e da
necessidade de cada um. O AEE é mais próximo disso, desenha-se pelo
aluno e por ele, e a educação está em construção dessa
modelagem. É preciso apagar os modelos e todos os modelos e
empreender, como desafio do AEE e da educação, uma práxis capaz de
comportar a diferença, a deficiência, o desconhecido, a
necessidade, bem como a potencialidade, a riqueza, a abrangência e o
ganho do convívio. Uma prática que não tenha modelos, mas que
construa todos os dias.
Referências:
CALVINO, Ítalo - PALOMAR, São Paulo : Companhia das Letras, 2004;
BRASIL, LDB 9394/96 - ACESSADO EM 06/07/2014 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm
BRASIL, CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988 ACESSADO EM 06/07/2014 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm
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